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Fazer pesquisa de mercado qualitativa com o público sênior exige uma nova caixa de ferramentas do pesquisador. Entenda nesse texto o que muda — e como se preparar para a demanda que está por vir.

Nos últimos meses, a equipe da Pipe.Social e Hype60+ mergulhou no universo da maturidade para entender hábitos, comportamentos, estilos de vida e o novo significado do que é envelhecer. Dessas descobertas, nascerá um estudo inédito sobre a maturidade, um raio-X, em primeira mão, do chamado mercado prateado, o TSUNAMI60+! Porém, antes do debate sobre os resultados da pesquisa, torna-se relevante também falar sobre o processo que nos levou à esses dados.

Cada etapa da pesquisa gerou um novo aprendizado: da busca por dados históricos às entrevistas qualitativas e quantitativas com o público maduro.

Se você trabalha com pesquisa de mercado, mas nunca realizou um estudo focado nesse recorte demográfico, saiba que essa será uma demanda cada vez mais frequente nos anos que estão por vir — e para a qual poucos pesquisadores estão preparados. Se você já está liderando uma estratégia de marketing voltado ao público maduro, entenda como o processo de colheita dos dados qualitativos muda de acordo com esse perfil.

A cofundadora do Pipe.Social, Livia Hollerbach, trabalha com pesquisa de mercado há 15 anos, dedicando os últimos dois a estudos de impacto sócio-ambiental. Já trabalhou em institutos de pesquisa reconhecidos, atendendo marcas como Unilever, Pepsico e Nestlé, mas nunca recebeu um projeto com o objetivo de explorar o mercado consumidor dos 60+. A primeira vez que a demanda surgiu foi com o projeto desenvolvido em parceria com o Hype60+, em março desse ano.

A primeira surpresa já veio logo no início do projeto, quando o parceiro de recrutamento se deu conta: ele não tinha uma base de dados com representatividade para esse mercado. Talvez reflexo da mesma experiência vivida por Livia: ninguém parou para analisar os hábitos de um consumidor cada vez mais relevante e ativo.

“Nesse momento nós percebemos como o público sênior é considerado, de fato, um consumidor invisível. Se as maiores marcas do país não estão falando com eles, quem está?”, nos contou Livia Hollerbach

Conheça agora os principais aprendizados do processo da pesquisa de mercado qualitativa com o público sênior do TSUNAMI60+ (os aprendizados do processo quantitativo vêm no próximo artigo!):

_RECRUTAMENTO DOS ENTREVISTADOS

O processo de recrutamento começou do ponto zero, contando com indicações de amigos e convites feitos na rua. Ao final do processo, formou-se uma base com 88 pessoas, de 5 capitais do país: São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre.

A metodologia utilizada envolvia a visita às casas dos entrevistados, com conversas em profundidade feitas com o anfitrião seguidas de uma conversa com mais três amigos dele — pessoas com perfil demográfico semelhante.

Pela experiência de Livia, o convite para entrevista com outros públicos normalmente é respondido no mesmo dia. O pesquisador liga perguntando da disponibilidade e o recrutado avisa se pode ou não participar. Porém, com esse público, a conversa precisou ser mais profunda: o time de recrutadores explicava do que se tratava a pesquisa, com mais argumentos para contar cada detalhe, explicar aos filhos e enviar documentos timbrados sobre o objetivo da visita, subtraindo, assim, o receio de receberem um estranho em casa. O tempo de retorno, portanto, levava de 3 a 4 dias entre o contato inicial, a devolutiva do entrevistado e a confirmação dos amigos que também o visitariam no mesmo dia.

“Nós tínhamos considerado um semana de recrutamento, mas o processo acabou levando 20 dias. Tivemos que começar as entrevistas e continuar, em paralelo, marcando novas visitas. O Thomaz, da Novo Conceito e nosso parceiro de recrutamento, deixou 3 recrutadoras dedicadas, quando um projeto como esse demandaria apenas uma, já que a conversão era muito mais baixa de pessoas confirmadas, em comparação ao número de convites feitos.” comenta Livia.

_ROTEIRO & METODOLOGIA DA PESQUISA

O roteiro da visita tinha o objetivo de entender o modo de vida do público maduro, o que envolvia um tour pela casa, abrir geladeira, armário, conhecer o banheiro, as roupas, as fotos e conversar sobre o dia a dia e temas mais íntimos como religião, relação com a família, saúde, higiene pessoal e sexualidade. Passadas duas horas de conversa, chegavam três amigos — ou amigas — do anfitrião para se juntarem à conversa.

“O público mais velho, especialmente acima de 75 anos, ficava exausto depois de duas horas de conversa. Para minimizar esse cansaço, nós criamos estímulos que os colocassem em movimento toda vez que a energia baixasse. Saíamos da sala para a cozinha e criamos atividades com post its e canetinhas…”

Por isso, Livia recomenda a criação de um roteiro mais enxuto com uma metodologia que mude a dinâmica de tempos em tempos, em vez de manter uma conversa de 3 horas ininterruptas com o entrevistado. Além disso, calcule o dobro de tempo gasto com cada pergunta. Isso porque a velocidade de resposta é mais lenta, tanto pelo ritmo da fala de alguns, quanto pelas experiências contadas que voltam a um passado distante, com mais digressões.

Uma forma de tornar a experiência menos cansativa foi seguir a metodologia do “mostre, não fale”. Em vez de ouvir sobre os hábitos alimentares, eles abriam a geladeira. Em vez de saber do comportamento digital, olhavam histórico de navegação e os aplicativos no smartphone. O resultado da pesquisa poderia ser entregue também na forma de fotos, de modo mais realista do que apenas a partir da narrativa de quem está sendo entrevistado.

Apesar de parecem cansados ao final da conversa, Livia conta que era recebida com muito carinho e alegria. Muitas vezes, a equipe saia da casa com presentes, bolo e uma sensação de acolhimento que não sentiam com nenhum outro projeto. “As mulheres faziam chá da tarde, com bolinho e café para receber as amigas. Já os homens compravam cerveja e salgadinho, virava o clube do Bolinha.”. Para recompensar o tempo dedicado, cada entrevistado recebia uma remuneração em dinheiro.

Depois dessa maratona, o time envolvido nas entrevistas passou dois dias reunido em uma sala fazendo o download dos insights obtidos no campo. Cada um compartilhava o que viu em cada cidade, em busca de semelhanças e diferenças entre os entrevistados. São esses insights da pesquisa de mercado qualitativa com público sênior que inspiraram o questionário quantitativo, criado com o objetivo de entender se um padrão encontrado na pesquisa qualitativa tem representação estatística.

DICAS DE COMO REALIZAR PESQUISA DE MERCADO QUALITATIVA COM O PÚBLICO SÊNIOR:

  1. Considere um tempo maior para o recrutamento dos entrevistados
  2. Auxilie a equipe recrutadora com bons argumentos para passar segurança aos entrevistados
  3. Crie um roteiro com menos perguntas e mais interações
  4. Use a metodologia “mostre, não fale” e não se esqueça de registrar cada momento
  5. Nada de correria! Se permita um tempo para entender e aprender com os 60+

Imergir nesse universo, durante os últimos meses, foi um processo bastante rico para todo o time envolvido por diversas razões: além de desconstruir imagens pessoais que cada um carregava sobre a realidade dos seniores no Brasil, pudemos conhecer de perto os novos caminhos de uma maturidade mais ativa, independente e protagonista. Traduzir essa realidade em um estudo inédito, sem precedentes no Brasil, é a nossa contribuição para lançar luz ao potencial de mercado invisível dos que têm mais de 60 anos.

Muito em breve, vamos fazer barulho com essas descobertas e provocar, quem sabe, um tsunami. Até lá!

* Texto publicado originalmente no blog do Hype60+